Canal do Instagram: a política no espaço da convivência
- Lucas Comunica

- 21 de out.
- 3 min de leitura
A nova dinâmica dos canais do Instagram e o desafio de transformar influência em convivência.

Há algo de silencioso nas transformações das plataformas. Nem sempre é o algoritmo que muda o comportamento; às vezes, é apenas o lugar onde as coisas acontecem. Foi o que se deu com os canais de transmissão do Instagram em 2025. Deixaram de ser uma aba separada, um espaço à parte dentro das mensagens, e se misturaram ao fluxo cotidiano da conversa. Agora, a mensagem do canal aparece no mesmo ambiente em que chegam as vozes mais íntimas: amigos, família, colegas de trabalho.
Essa fusão muda tudo. Quando o canal deixa de ser um corredor exclusivo e se transforma em parte da caixa de entrada, o creator e, sobretudo, o político, perde o pedestal. Ele fala no mesmo tom de quem manda um meme, um vídeo engraçado, uma promoção de loja virtual ou um comentário num story. O gesto é sutil, mas político: a autoridade se dissolve em presença. A comunicação, antes planejada como um ato público, passa a ser vivida como fragmento de convivência.
É nesse ponto que a política pode aprender com os influenciadores. Eles entenderam antes de todos que o vínculo nasce da rotina, não da performance. Não há contradição entre proximidade e influência; há entre proximidade e formalismo. O político não precisa fingir intimidade, precisa habitá-la. O problema não está em dizer que está frio, que pegou chuva, que chegou tarde, que vai comer com a família; está em acreditar que isso é banal. É justamente o ordinário que constrói identificação. As pessoas se conectam com pessoas, não com cargos.
O erro não é ser íntimo, é ser artificial. O que distancia o eleitor não é a naturalidade do tom, mas o uso dela como ferramenta de convencimento. Quando o canal vira panfleto, com o “fiz isso”, “entreguei aquilo”, “consegui tal recurso”, ele volta a soar como informe de assessoria. E o eleitor, que abre o Direct para ver uma conversa, se depara com o eco de uma coletiva de imprensa.
O contraste com o WhatsApp revela o quanto essa mudança é singular. Em quase tudo, o WhatsApp é o território da intimidade: é onde se falam as famílias, os amigos, os grupos de vizinhança, os afetos cotidianos. Mas, nos canais, essa lógica se inverte. Enquanto o Instagram trouxe o canal para dentro da caixa de entrada, misturando as mensagens ao fluxo da vida digital, o WhatsApp manteve os canais num espaço separado, distante do convívio. É um ambiente de fala unilateral, em que alguém comunica e os outros apenas reagem.
Nos canais do WhatsApp, a comunicação ainda se organiza pela lógica da mobilização. Servem para informar, reforçar posicionamentos e manter ativa a base engajada. São úteis como estrutura de coordenação, mais do que como espaço de vínculo. E há um mérito nisso: o conteúdo compartilhado a partir do canal carrega uma pequena barra com o link direto, o que amplia o alcance e ajuda a sustentar a narrativa entre os apoiadores.
No Instagram, porém, o gesto é outro. O canal foi trazido para dentro da convivência, para o meio do fluxo afetivo. A mensagem agora chega junto das conversas pessoais, dos memes, das respostas rápidas, das trocas de rotina. Isso não é apenas uma escolha de design, é uma mudança de linguagem. O político que fala ali não está num púlpito digital, mas sentado à mesa com quem o lê.
O desafio, portanto, não é usar bem o canal, mas compreender o canal como parte da convivência. Um canal que pergunta, comenta o clima, compartilha percepções e se deixa atravessar pelo cotidiano é muito mais político do que aquele que apenas anuncia feitos. Porque a política, quando é viva, nasce desse tecido de presenças. É feita do mesmo material da vida comum.
Talvez o Instagram tenha feito, sem querer, um gesto civilizatório. Ao colocar os canais no mesmo plano das conversas, ele empurra a comunicação pública para dentro da intimidade cotidiana e obriga o político a reaprender o ofício da fala. Não se trata mais de ocupar o espaço da atenção, mas de caber no espaço do afeto.
O canal deixou de ser um megafone numa praça que você decide ir e passou a ser uma mesa posta. O político que compreender isso não falará apenas com eleitores, falará com gente.







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