A derrota da blindagem: quando a pressão das ruas atravessa o Congresso
- Lucas Comunica

- 24 de set.
- 3 min de leitura
Atualizado: 8 de out.
A PEC da Blindagem escancarou o antipolítico, uniu vozes além da esquerda e da direita e caiu sob o peso das ruas.

A chamada PEC da Blindagem nasceu torta. Um dispositivo constitucional que pretendia transformar prerrogativas parlamentares em muralha de impunidade, repondo voto secreto e ampliando foro privilegiado, era tão descolado do espírito democrático que não resistiu ao primeiro embate sério. Hoje, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado rejeitou a proposta por unanimidade, amparada no parecer demolidor do senador Alessandro Vieira, relator que enterrou a PEC na CCJ. A imagem que fica é a de uma derrota acachapante: um projeto sem defensores, sepultado pela pressão popular e pelo cálculo político.

O movimento que enterrou a PEC, porém, não se explica apenas pela aritmética parlamentar. Ele brota da rua. Nos últimos dias, manifestações massivas ocuparam as capitais brasileiras sob duas bandeiras: “não à anistia” e “não à blindagem”. Sozinha, a pauta da anistia contra Bolsonaro já teria ecoado forte no campo progressita. Mas a inclusão da blindagem como alvo expôs uma indignação difusa que potencializou o cidadão progressista a sair de casa e revelou uma figura importante: o antipolítico.
Esse sentimento, que não se resume a uma ideologia, tornou-se fiel da balança. Está no centro, mas também infiltrado nos polos. Na esquerda, aparece como frustração com as engrenagens da governabilidade; na direita, como combustível para a narrativa populista. E aqui há um detalhe: a extrema-direita, mais hábil em manipular ressentimentos, soube desde a ascenção do bolsonarismo capitalizar esse eleitor. No caso da blindagem, a equação se inverteu.
Foi um tiro no pé. Ao negociar a votação da PEC da Blindagem na Câmara em troca da urgência da anistia, a direita bolsonarista escancarou o pior de si: a disposição de blindar-se enquanto pedia clemência para o seu líder. A operação soou contraditória e corrosiva. Se a imagem do político ladrão e corrupto já fazia parte do imaginário brasileiro, a PEC não apenas a confirmou, cimentou-a de vez, transformando os parlamentares que votaram nela, de todos os espectros, em cúmplices de um pacto explícito de autoproteção.

Nesse jogo, o Congresso sentiu o peso das ruas. O recado foi direto: qualquer tentativa de resguardar privilégios em plena crise democrática não passaria incólume. O Presidente da Câmara Hugo Motta, um dos articuladores, esqueceu de combinar com Davi Alcolumbre, que articulou a votação da CCJ no Senado sem dar espaço para manobras dilatórias. A coordenação falhou, e o projeto desmoronou.
Curiosamente, quem também sai fortalecido desse episódio é o governo. Embora não tenha sido protagonista da rejeição, o Planalto ganha crédito político indireto. A derrota da blindagem reforça o discurso de que, sob a atual gestão, retrocessos institucionais não prosperam. Não é pouco, em um ambiente de desconfiança generalizada.
Comemorar a rejeição da PEC é, portanto, mais que celebrar uma vitória técnica: é reconhecer que a sociedade mostrou sua capacidade de frear um absurdo. Se a anistia segue como batalha aberta, a blindagem foi derrotada pela conjunção de fatores improváveis: pressão popular, cálculo institucional e erros estratégicos do centrão e da direita.
No fim, o que poderia ter sido um golpe silencioso contra a democracia se transformou em alerta. E o Brasil, ao menos por hoje, respirou um pouco mais aliviado. "A derrota da blindagem: quando a pressão das ruas atravessa o Congresso" é um artigo escrito por Lucas Comunica para Dual Comunicação Política.








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