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Não existe ex-professor

Eduardo Jara e a arte de ensinar com generosidade, método e humor.


Professor Eduardo Jara recebendo cerca de 60 crianças em oficina que marcou os 10 anos do Esag Kids. Foto: Pablo Rodrigues. Reprodução: UDESC/ESAG.
Professor Eduardo Jara recebendo cerca de 60 crianças em oficina que marcou os 10 anos do Esag Kids. Foto: Pablo Rodrigues. Reprodução: UDESC/ESAG.

Talvez o maior impacto de alguém não esteja no que diz, mas no que nos faz pensar a partir do que disse.


Eduardo Jara não foi apenas um professor. Foi daqueles que reconfiguram nossa forma de raciocinar com precisão, humor e generosidade. E quando alguém assim parte, o que fica não é saudade: é lembrança.


Jara foi meu professor de Estatística no curso de Administração Pública da Udesc/Esag, em 2017. Mas seria injusto dizer que me ensinou só números. Pra começar, ensinou que conhecimento não se entrega empilhando fórmulas, mas despertando curiosidade, algo bem diferente do que o ensino público estadual no ensino fundamental e médio tentou me empurrar a vida inteira. E nisso ele era mestre. Sua aula parecia mais uma experiência de laboratório, não pela complexidade, mas pela mistura improvável de método e encantamento.


Era impossível não lembrar do Beakman. Não pelo exagero cênico, mas pela lógica invertida e pelo fascínio com o “porquê” das coisas. Jara também explicava estatística como quem desmonta o mundo pra mostrar como ele funciona por dentro. Tinha o cabelo rebelde, o jaleco branco e aquele olhar inquieto de quem trata a curiosidade como método. Como Beakman, não ensinava fórmulas: plantava dúvidas que cresciam em silêncio até virarem entendimento.


Professor Eduardo Jara durante ações do projeto STF nas escolas, em fevereiro deste ano. Foto: STF/ESAG KIDS.
Professor Eduardo Jara durante ações do projeto STF nas escolas, em fevereiro deste ano. Foto: STF/ESAG KIDS.

Eu mesmo tive a oportunidade de, naquele mesmo ano de 2017, ser professor voluntário em um projeto da própria ESAG vinculado ao programa de extensão ESAG Kids, coordenado por ele. Era o Ciclo de Oficinas de Habilidades Esaguianas, voltado ao ensino de empreendedorismo e habilidades socioeconômicas para estudantes do ensino médio da rede pública. O convite veio do próprio Jara. Ministrávamos oficinas no Centro Cultural Anastácia, em parceria com o Instituto Padre Vilson Groh. Era nossa tentativa de fazer o conhecimento chegar mais longe, como ele nos ensinava: com generosidade.


Tive outros momentos marcantes com ele. Um deles foi quando comentei que um dos meus livros favoritos era O Homem que Calculava, de Malba Tahan (pseudônimo do professor brasileiro Julio César de Mello e Souza). Um romance que tinha como personagem principal um matemático. Ele então me recomendou um livro que também se tornaria um dos meus preferidos: O Andar do Bêbado: como o acaso determina nossas vidas. Um livro contraintuitivo, que mostra com exemplos reais como o ser humano não está preparado para lidar com o aleatório, muitas vezes sem sequer reconhecê-lo.


Foi na ESAG que ele construiu esse legado, mas a marca que deixou não cabe numa instituição. Jara era o tipo de educador que não se contentava em dar aula. Ele queria ensinar. E há uma diferença abissal entre uma coisa e outra.


Quantas vezes vi ele transformar um conteúdo árido em algo acessível, só pela forma como olhava pra quem ainda não entendia? Quantas vezes percebi que ele se preocupava mais com a pergunta do que com a resposta pronta? Jara não queria formar alunos. Queria formar gente.


E conseguiu.


Dedicou tempo, energia e brilho para projetos que levassem ciência a quem nem sabia que gostava de ciência. Levou conhecimento complexo de maneira lúdica para crianças. Tornou lógica um jogo. Tornou aprendizado um gesto de cuidado.


No velório, a mistura agridoce de chorar e rir era o sentimento de ver o que resumia Jara nas coroas de flores. “Gênio”, “Obrigado”, “Estamos honrados em termos aprendido com você” era o que mais aparecia.


Essas frases me atravessaram. Não porque eram bonitas, mas porque eram verdadeiras.


Eduardo Jara foi um desses raros nomes que atravessam nossa biografia. Um dos poucos que, quando partem, a gente sente que o mundo ficou um pouco menos curioso. Um pouco menos generoso. Mas também mais responsável por continuar o que ele começou.


Porque quando a fonte do conhecimento se torna finita, o que ela ensinou passa a viver em quem aprendeu.


E quem ensina de verdade não parte. Fica.

Em cada raciocínio mais claro.

Em cada explicação mais cuidadosa.

Em cada tentativa de tornar o complexo mais humano.


Jara vive nisso tudo.


E por isso, pra mim, não existe ex-professor.

Só gente que segue ensinando, mesmo quando já não está mais aqui.


Obrigado, professor Jara.

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